A indústria de embalagens não admite que tem um problema com a preservação ambiental
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É difícil imaginar como o advogado Stephen Joseph não foi tomado por um acesso de alegria quando, em 2008, denominou sua organização de Aliança para Salvar Sacolas Plásticas. Até porque a maioria das pessoas que defendem causas controversas das indústrias buscam nomes vagos o suficiente para induzir alguém ao coma. Joseph e sua aliança, no entanto, não estão se omitindo. Ao longo dos últimos quatro anos, eles têm travado uma batalha explícita, retórica e legal contra as crenças científicas e pressões legislativas da crescente legião de prováveis proibidores de sacolas plásticas — aqueles que pensam que a única e absoluta função desses itens é ser o incômodo ícone de um consumismo descartável e enlouquecido.
Os defensores da proibição de sacolas plásticas são rápidos em reconhecer em Joseph uma força a ser levada em consideração. Mas eles o acusam de praticar os mesmos excessos retóricos que condena. “Para ser eficiente, você precisa ter credibilidade”, argumenta Andy Keller, opositor que frequenta manifestações por toda a Califórnia vestido de Monstro da Sacola Plástica. “Mas Joseph e a indústria nem ao menos admitem que há um problema”.
Ele realmente não admite. A não ser pelo fato de se acumularem pelas ruas como lixo (algo que Joseph abomina), ele insiste que as sacolas plásticas não apresentam qualquer ameaça ao meio-ambiente. Elas ocupam espaço mínimo em aterros sanitários e não voam para o mar, justifica. No que diz respeito aos objetos plásticos que estão matando animais marinhos, ele alega que as verdadeiras culpadas são as redes de pesca abandonadas, e não as sacolas de compras.
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Proposta
Joseph vai ainda mais longe com seu argumento: ele acredita que sacolas plásticas são, na realidade, mais inofensivas que as de papel e cada vez mais elegantes que as renováveis. Essas, ele afirma, são muito caras além de pouco higiênicas. Quanto às sacolas de papel, ao se degradarem liberam gás metano, que é muito mais prejudicial à atmosfera que o dióxido de carbono. Em seu site, Joseph alega que as moléculas de plásticos não se degradam antes de 500 anos. Por conta disso, ele conclui que sacolas plásticas devem ser valorizadas e não demonizadas.
Stephen Joseph nunca quis se envolver na guerra pela proibição das sacolas e sempre se esforçou ao máximo para ficar fora dela. Natural de Manchester, na Inglaterra, mudou-se para os Estados Unidos em 1978, estudou Direito, e tornou-se advogado em 1980. Por um momento, trabalhou como lobista da indústria de fontes renováveis de energia.
Foi no dia 1º de abril de 2007 que duas companhias de sacolas plásticas entraram em contato com Joseph pela primeira vez. “Por quase um ano eu disse não a eles”, conta. Foi só depois que ambientalistas se opuseram a um programa de coleta seletiva projetado por uma das indústrias de sacolas plásticas que ele concordou com a proposta.
Proibição
Transformar a extraordinária permanência do plástico (um de seus principais problemas, segundo ambientalistas) em uma virtude ecológica é hoje um dos argumentos mais enérgicos de Joseph. Conforme especialistas em detritos marinhos já reconhecem, não há, por exemplo, uma ilha de lixo com o dobro do território do Estado do Texas flutuando no Oceano Pacífico. Nem há, também, qualquer dado científico confiável que comprove a frequente afirmação de que sacos plásticos matam 100 mil mamíferos marinhos e um milhão de aves marítimas por ano.
Como Joseph é hábil em combater esses questionamentos, sua função principal como líder da Aliança para Salvar Sacolas Plásticas acaba sendo a mesma que a de um agente policial. Se alguma cidade ou condado da Califórnia deseja aprovar restrições ao uso de sacolas plásticas (até agora foram 50), certamente receberá uma visita de Joseph.
Em 2007, parlamentares de São Francisco aprovaram a proibição da maioria das sacolas plásticas e tornaram a cidade a primeira do estado e do país a colocar em prática uma medida do gênero. O mesmo que ocorreu na Califórnia também vem acontecendo em todo o país: até o momento, mais de 30 estados aprovaram ou propuseram restrições a sacolas plásticas.
A Aliança para Salvar Sacolas Plásticas argumentou em processos protocolados em todo o estado que quaisquer medidas contrárias às sacolas violam a Lei de Preservação Ambiental da Califórnia, pois os municípios deveriam primeiro avaliar os impactos do crescente consumo de sacolas de papel que surge a partir da proibição das de plástico.
O Monstro da Sacola Plástica, Andy Keller, reconhece que cidades e condados foram obrigados a criar resoluções melhores e mais inteligentes. “Nós vemos hoje legislações mais eficientes e eu acredito que Stephen Joseph tem parte do mérito por isso”, ele diz.
No final das contas, é muito difícil que Joseph consiga impedir o desejo de tantos governos pela proibição das sacolas. Sacos plásticos correspondem a uma pequena fração das 250 milhões de toneladas de lixo que os norte-americanos jogam fora todos os anos. A maior parte desse volume permanece fora de nossas vistas e, portanto, de nossa mente. Um inconveniente para Joseph e os membros de sua coalizão é que isso não ocorre com as sacolas plásticas. Elas estão presentes no cotidiano. Joseph pode e continuará a debater até que ponto (se é que há um) sacolas plásticas representam um verdadeiro problema ambiental.
Tradução por Fillipe Mauro
* Texto originalmente publicado na revista Pacific Standard
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