Tom Hilton
Dunas Kelso, no deserto do Mojave, nos EUA: “dunas cantantes” emitem sons em baixíssima frequência
O engenheiro de som Trevor Cox estava inspirado quando desceu ao fundo de um esgoto.
Como especialista que desenha projetos para melhorar a acústica de salas de concertos e salões para conferências, Cox participava de uma entrevista coletiva quando teve uma revelação. “Escutei algo interessante vindo lá de baixo, um som se movendo em espiral ao redor do esgoto”, relembra. “Fiquei surpreso, e pensei: que outros sons extraordinários existem lá fora?”
Eventualmente, Cox embarcou no que seria a missão de sua vida: encontrar as maravilhas sonoras do mundo. Desenvolveu um site e começou a busca, viajando a antigos mausoléus com acústica peculiar, icebergs que rangem naturalmente e um órgão feito sob medida chamado Stalacpipe, que aproveita as reverberações das estalactites de uma caverna na Virgínia, nos Estados Unidos. Ele publicou um livro, The Sound Book [“O livro dos sons”, em tradução livre], um catálogo das viagens a esses lugares.
“Prelúdio em Dó Sustenido Menor”, do compositor russo Sergei Rachmaninoff, tocado no órgão Stalacpipe
Alguns dos destinos acústicos são bastante óbvios. Um exemplo bem conhecido é a galeria dos sussurros da Catedral de São Paulo, em Londres, chamada assim porque quem se postar contra o muro da galeria pode sussurrar e ser ouvido por quem estiver parado no lado oposto. Isso acontece porque as paredes são perfeitamente cilíndricas e as ondas de som dirigidas no ângulo correto podem quicar de um lado para o outro sem perder muito volume.
Mas há muitas outras galerias de sussurros que produzem efeitos ainda mais incríveis e são bem menos conhecidas. Um exemplo é uma estação de espionagem da época da Guerra Fria, em Berlim, que era utilizada por espiões norte-americanos e britânicos para escutar as comunicações da rádio da Alemanha Oriental. Como o quarto era bastante esférico, o efeito da galeria de sussurros é ampliado ainda mais. No entanto fazer ruído no centro do quarto leva a uma estranha distorção, enquanto as ondas de som ricocheteiam nas paredes e voltam juntas misturando-se e gerando uma cacofonia. “Você pode conseguir vários efeitos estranhos”, destaca Cox. “Ajoelhei-me para abrir o zíper da mochila e soou como se o zíper estivesse correndo por cima da minha cabeça.”
Um dos lugares mais impressionantes que Cox visitou é um tanque combustível abandonado em Inchindown, nas Terras Altas da Escócia, enterrado sob uma colina durante os anos 1940 para permanecer a salvo dos bombardeios alemães. “É um espaço enorme, do tamanho de uma pequena catedral, e lá dentro não há nenhuma luz além da nossa lanterna”, diz Cox. “Você não se dá conta do quão vasto é o espaço até fazer algum ruído, e então o eco segue e segue”.
A longa extensão do eco fez com que Cox pensasse que ele pudesse superar o eco do Mausoléu de Hamilton, também na Escócia, obtendo o recorde mundial de eco de maior amplidão. Para comprovar a suspeita, disparou uma pistola sem munição e mediu o tempo da reverberação do barulho dos disparos, e conseguiu chegar aos 75 segundos, confirmando assim o novo recorde.
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Muitas das maravilhas sonoras de Cox são resultado de fenômenos naturais. Ele visitou áreas em que dunas de areia zunem naturalmente, como as Dunas Kelso, no deserto de Mojave, nos EUA, um dos 40 lugares com “dunas cantantes” no mundo.
Em algumas condições, pequenas avalanches de areia caindo pelas dunas podem produzir sons. Ainda não há uma compreensão total de por que isso acontece, mas sabe-se que o fenômeno depende do tamanho e das formas dos grãos, assim como do nível de umidade da areia que cai.
Cox viajou a Mojave durante o verão, quando o deserto está mais seco, aumentando a possibilidade de escutar os cantos das dunas. Não escutou nada na primeira noite, mas na manhã seguinte ele e sua equipe foram capazes de gerar sons empurrando areia duna abaixo.
Cox também partiu em busca de sons emitidos por animais. Entre os mais incomuns que encontrou estão os chamados de acasalamento das focas-barbudas do Alaska, que soam como ruídos de alienígenas de filmes de ficção científica dos anos 1950.
“As focas-barbudas produzem vocalizações incrivelmente complexas, com sons longos e secos e descendentes que trinam e cujas frequências descendem espiralmente”, escreve Cox. Como os chamados buscam atrair a atenção das fêmeas, os cientistas acreditam que pressões evolutivas fazem com que os machos emitam ruídos cada vez mais extravagantes, dando como resultado sons extraordinariamente estranhos, como estes gravados utilizando um microfone submarino no Alaska.
“Enquanto escrevia o livro, fiquei mais consciente dos sons interessantes que nos atravessam a cada dia”, diz Cox, “e agora me pego escutando mais e mais enquanto passeio. Quando a primavera foi chegando, escutei como os animais voltam à vida. Até em meio ao rumor do trânsito, escuto as canções dos pássaros que regressam depois de um longo inverno”.
Tradução: Mari-Jô Zilveti
Texto originalmente publicado no site Pijama Surf, site espanhol que se dedica a temas de cultura e comportamento.