Se você já viveu em uma cidade densamente povoada, provavelmente já brincou de olhar de sua janela para os apartamentos de um prédio vizinho e inventar histórias sobre as pessoas que vivem ali. Mas quanto, de tudo o que imaginamos sobre nossos vizinhos, de fato se aproxima da realidade?
Fotos de Gail Albert-Halaban
Recentemente, Gail Albert-Halaban, fotógrafa da cidade de Nova York, passou um ano explorando o tema em Paris, indo de um prédio a outro a fim de capturar momentos íntimos: uma garota praticando clarinete, uma mulher com seu gato no colo, um homem lendo um livro.
Você pode até se sentir como um voyeur ao olhar para estas fotografias — algumas delas fazem parte da exposição “Paris Views”, na Galeria Kopeikin, de Culver City —, mas as imagens não só são encenadas e fotografadas com lentes de distância focal normal, como também uma colaboração entre Albert-Halaban e as pessoas dos dois lados da cena. As pessoas que alugaram seus apartamentos para a realização do projeto descreviam o que viam e imaginavam sobre seus vizinhos do outro lado da rua, e os vizinhos contavam como suas vidas realmente eram. Os dois lados se reuniam para planejar a fotografia: a que horas seria tirada e o que retrataria. No processo, novos relacionamentos se formaram, o que era uma parte importante do projeto.
“Antes as coisas eram assim: íamos até a loja ou o café da esquina e encontrávamos nossos vizinhos, mas agora vivemos em um mundo completamente mediado por telas de computadores”, diz Albert-Halaban. Este projeto é “sobre ter contato face a face com nossos vizinhos, de tal forma que não apenas os observemos e julguemos, mas também possamos nos tornar irmãos e irmãs”, conta.
As fotos de Paris não foram sua primeira incursão na fotografia de janela. Ela já passou seis anos fotografando cenas semelhantes em Nova York, principalmente em seu bairro, Chelsea. Para a série “Pela Janela”, amigos e conhecidos davam dicas sobre vistas atraentes, e ela escrevia aos residentes explicando o projeto e solicitando uma reunião. A maior parte das pessoas se interessou e desejou participar.
Foi um pouco mais difícil em Paris, onde as pessoas tendiam a se intimidar diante da ideia de permitir que um fotógrafo entrasse em suas casas. Mas com a ajuda de Cathy Remy, editora de fotografia da M, a revista do Le Monde, Albert-Halaban tirou dez fotos em outubro de 2012, todas publicadas na edição seguinte da M. O projeto final foi reunido em um livro chamado “Gail Albert Halaban: Vis à Vis” (Editions De La Marintere, 2014), incluindo 70 fotografias tiradas entre 2012 e 2013. A Aperture Foundation publicou a versão em inglês, “Paris Views”.
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Uma das fotografias mostra uma mãe diante do berço de seu filho. Em um primeiro momento, a mulher disse estar muito ocupada para ser fotografada. Mas, após aceitar participar, Albert-Halaban descobriu que as duas tinham muito em comum. “Eu vi a bagunça no quarto de seu filho e me lembrei da bagunça que é o quarto do meu filho”, diz Albert-Halaban. “Ela é uma mãe trabalhadora que está sempre fazendo várias coisas ao mesmo tempo”. A mãe, que revelou mais tarde que ela e o pai de seu filho eram vizinhos que se observavam pela janela, é agora uma grande amiga de Albert-Halaban.
Estas interações fizeram com que Albert-Halaban se sentisse em casa em Paris. Em seu próprio “excêntrico” prédio no Chelsea, todos se conhecem. Há um autor de romances policiais no quinto andar, um pintor no sétimo andar e uma pessoa que produz mel. Suas relações foram fortalecidas pelo Furacão Sandy, que atingiu a cidade um dia após Albert-Halaban viajar para Paris, em 2012. Embora ela não tenha vivenciado o desastre, seus amigos e familiares que ficaram em Nova York contaram sobre o importante papel desempenhado pelos vizinhos. “Meu apartamento tinha eletricidade e, por isso, tornou-se o lugar onde as pessoas se reuniam. (…) As pessoas realmente criaram laços de amizade”, revela.
Albert-Halaban planeja tornar seu projeto global. Até o momento, ela já esteve em Utrecht, na Holanda, e em Istambul, na Turquia. Os presentes que ela leva aos encontros entre vizinhos em cada cidade variam — vinho em Paris, chocolate na Holanda —, mas a retribuição é a mesma em qualquer lugar.
“Eu realmente acredito que, se em vez de simplesmente observarmos uns aos outros, nós nos reuníssemos e nos envolvessemos uns com os outros, seriamos vizinhos muito melhores”, diz. “Teríamos uma comunidade muito mais forte”.
Flick/CC/j-No
Mostra realizada em Nova York com fotografias tiradas na cidade
Texto publicado originalmente pelo site Zócalo Public Square
Tradução: Henrique Mendes